04/04/2020 - 193 dias
Theo, vou continuar escrevendo pra ti, já que me motiva muito mais a detalhar o que está havendo. Não escrevi antes e não foi por falta de tempo em casa. É pelo bombardeio diário de informações.
Acontece que em novembro e dezembro de 2019 os jornais começaram a falar de um novo vírus Corona, uma epidemia na China. Somos ingênuos o suficiente para achar que isso era um problema longínquo. Uma região do país em quarentena, com todas as fronteiras fechadas para impedir que o vírus se alastrasse. Hospital de campanha de 1.000 leitos construído em 10 dias.
Caminhões lavando as ruas vazias da cidade, profissionais de saúde e limpeza tão paramentados que mais pareciam astronautas deslocados na terra. Como tudo parecia exagero vendo de longe. Mais de 3.300 pessoas morreram lá.
Aì o vírus chegou na Itália, que controlava sem grandes restrições à população. Em poucas semanas o caos surgiu, a síndrome respiratória aguda ou insuficiência renal foram levando mais e mais vidas. Pessoas que morrem em isolamento sem poder receber um último abraço da família, enterros sem funeral. Centenas por dia. Até hoje foram 14.680.
Assim progressivamente os países foram sendo apanhados pela onda que arrebenta desenfreada. Na Espanha já são 11.744 mortos, França 6.507, Estados Unidos (novo epicentro) 7.844. A maioria acima dos 60 anos, mas nem todos.
E o que fazer? A maioria dos líderes mundiais (não o nosso presidente), médicos e cientistas concordam que o melhor é que todos fiquem em casa. Não há leitos para todos que precisam de internação. Não há UTI nem respiradores suficientes para a demanda.
Assim, no último mês a programação de entretenimento foi quase toda suspensa e deu lugar a um sem fim de programas que discursam sobre a necessidades de todos ficarem em casa, lavar as mãos com frequência, não tocar boca, nariz e olhos, usar álcool gel, luvas, máscaras. A população foi se acostumando a entender a diferença de quarentena e isolamento social.
O governador de Santa Catarina Carlos Moisés decretou emergência no dia 18 de março de 2020, impondo restrições à circulação de pessoas e às atividades econômicas. Escolas, comércio e serviços pararam. Praias proibidas e parques fechados. Todos que podem (quando a profissão permite) passam a trabalhar remotamente. As escolas começam a produzir material para ensino à distância. Permanece apenas o essencial.
As pessoas vão ao supermercado, mas fazem cara de nojo quando se encostam sem querer. Parece frear o avanço da doença. Achata a curva do contágio, como se repete inúmeras vezes. Mas isso tudo está trazendo uma grande pressão econômica. O presidente continua nos envergonhando e fazendo pronunciamentos de que isso não é grande coisa. quer que tudo abra e funcione normalmente.
E nós? Você deve estar se perguntando. Eu e o Cris já estávamos razoavelmente isolados do mundo desde a metade da gravidez. Emendei a licença maternidade com férias. Ficar em casa em família, só nós três, não é novidade. A novidade é que agora é obrigatório. A novidade é que sua rotina de consultas foi suspensa, a cirurgia da hidrocele foi suspensa. Nada de visitas de ninguém da família, tios, tias, opa, oma, nada. Nem babá.
O Enalapril, que é inibidor de ECA foi suspenso enquanto não houver clareza da relação do uso desse tipo de remédio com o vírus. Tudo isso por que? Porque você está no grupo de risco, por ser doente renal crônico, cardiopata e hipertenso. Grupo de risco significa que meu bebê corre risco de vida se contrair a doença. Toda a novela de “meu filho pode morrer” de novo e de novo e de novo.
E assim seguimos, mamãe, papai e bebê somente. Teu pai disse que nós temos o privilégio de te isolar totalmente em local seguro enquanto a gente não sabe como isso vai se desenvolver, que nos preparamos com espaço físico e economicamente durante a gestação possibilitando que ficássemos seguros e confortáveis por algum tempo - não sabemos quanto tempo será -, que o emprego da mamãe é estável mas tememos por mudanças, que a empresa do papai cresceu bem nesse momento - também não sabemos por quanto tempo.
Plantei uma horta nova e passamos a comprar alimentos orgânicos pra você, que está passando pelo comecinho da introdução alimentar no meio desse furacão.
Dizem por aí que o mundo não será o mesmo depois dessa pandemia. Você que me dirá.
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